Assim ele se foi :
na asa delta do passarinho
no delta da rêmige
afim de ninho
ao fim do ninho
leite e ninho
- do fim aos confins
na queima do serafim
em cinzas de amor sem fim
Partiu para o outro lado do silêncio
do espelho de Alice
Partiu o espelho
a lâmina d'água
aonde se inclinou
a admirar sua imagem em água talhada
- sua efígie aquática
de saracura de paul
garça no esbranquiçado do osso
abandonado do corpo
Entrou pelo espelho de Alice
admirando Narciso em flor silvestre
no sorriso algo cínico do gato
em esgar do desenho lunar
- o imenso sorriso do gato de Alice
no país das maravilhas
distante alguns sonos e sonhos
léguas da realidade prosaica
Quedou-se frente ao espelho
ou à amina d'água com efígie de saracura-do-brejo
trincando suas especulações com a alma em pedra na física quântica
lançada ao espelho ou ao espectro
nas cores que a lira tange a grei
os rebanhos em existência e migração de gnus
também nos universos paralelos
que parafraseiam matéria e anti-matéria
desunidas a "quarks"
e supostamente unidas por "bosons"
se este liame é força forte
no amarrar tempo e espaço
formando um vaso ou ânfora
canto ou cântaro
ouvindo a cachoeira ribombar
no que cai a água
dentro do coração branco do anjo
errante em queda
que foi em água
quando deveria ser em terra
- no pó da terra desidratada
menina febril
com febre terçã ou quartã
Vejo-o em menino
na primeira vez que o vi
- então um menino de fina ironia
soltando a pipa no azul celeste
tangida a vento
rasgada ou remendada no azul roto
de um violinista que quero azul
- azul de um céu azul
Era um menino alegre e assaz zombeteiro
como sói àqueles nos quais sobeja a saúde
e á inteligência de escol
Corria atrás das borboletas
- perseguia sôfrego a vida
e a alma que é uma pena de ave na vida
pena leve e livre
com o espírito de poucos homens
soprados nas narinas
por anjos lúdicos
que gostam de soprar bolhas de sabão
junto ao menino
- ao menino de todos os tempos
em todos os espaços
As borboletas fincava-as criteriosamente
como o antigos naturalistas ingleses
mortas num quadro
colecionando-as
Atravessara eras em caravelas
viera em caravelas
enquanto outros viera em vieiras
e outros moluscos
com conchas bivalves
cheias ou recheadas literalmente de vidas
enquanto carregasse a concha
"às costas" e nas costas do mares e oceanos
De cara e vela para o vento
vinha na ventoinha de uma caravela
- dando a cara a bater
( a face não esbofeteada)
ao vento em barlavento e sotavento
bombordo estibordo
e também as velas
infladas qual asas em cruzes cristãs
- cruzes espanholas ou portuguesas
no mar imenso
de onde emergia de chofre um leviatã imaginário
no placebo do real
- no real placebo
do mito que servia ao rito do medo
- não o medo do mar oceano em procela
mas do rei
um pequenino bobo na corte
que tomara o poder
e mantinha-o graças ao poder do medo
- que é um poder maior que o medo
Amava as meninas
juntamente com todas as ciências
e mormente a literatura
- mãe acolhedora das ciências
genial em Dostoievski
Em dia que era noite
escureceu o mundo subitamente
apagou a brasa do sol
que se tornou um carvão
numa treva de tristeza espessa demais para a travessia...
- Neste dia em noturno soturno
conheceu sua primeira e quiçá maior e mais pungente dor
quando perdeu a mãe
para a primeira morte com garras de harpia
que chegou envolta nas trevas
que vinha embuçando a predadora emboscada
então próxima à orla do rio Lethes
com o barqueiro Caronte roubando o ser mais querido de sua vida
a primeira alma que ele conheceu no ventre
- que era sua mãe
intacta no carinho aconchegante do casulo
que o guardara em crisálida
antes que viesse o amor da mulher
e o amor do filho ou filha
que suplanta o tempo
e mesmo a mãe
- antes do amor da borboleta
que rompe o casulo
e sai para o vôo no mundo
- vôo pisado a flores e fragrâncias no ar
que enta as asas
Foi uma noite de infinitos gritos
ou mil e uma noite de lamentações!
de uma dor sem fim
Clamores que ainda ouço
conquanto não os tenha ouvido
como meus ouvidos humanos à época
Finda a progenitora
seguiu mais solitário pelos descampados
carente do carinho da mãe
vagou pela terra sem ternura
em meio ambiente da hipocrisia
que é um governo nuclear na sociedade e cultura
( A base de tudo, Marx,
não é a economia política
mas a hipocrisia política )
O tempo retorcido no verme
que remexe o universo
na dança da vida
na qual o verme é um dos melhores bailarinos
ou bufão-barítono
- ou tenor de Ópera italiana
era um tempo em balada
antes do homem
- antes do meu amigo
ser o homem morto
para sempre separado da luz
e das sombras noctívagas nos morcegos negros
( O verme é uma alma
que prescinde da missa em latim )
O tempo o cindiu
separou anatomicamente e com espada ou bisturi
seu corpo de homem
e seu corpo de Fauno
porquanto o ser humano é mais um Fauno
dentro da libido do homem
que um corpo humano
( Os biologistas e médicos de plantão nos hospitais
esquecem o corpo do Fauno
pois impingem-lhes desde tenra idade
no labor honesto dos estudos em vermelho de sangue
a ignorar sumariamente
a anatomia e a fisiologia do Fauno
quando homem
e da Flora na mulher florida
fornida formosa ninfa e Graça
( as três Graças
é pouco para representar uma única mulher!
- quando a amamos com o viço do Fauno
vegetal vegetativo e animal
humano e mitológico
poeta e sábio e santo
filósofo e outros tipos de eruditos
que engendram ou revisitam o conhecimento)
Através da operação que destrava o corpo da alma
colhendo o derradeiro alento do espírito
que se evola
na última exalação
do vento que pára
de insuflar as velas
daquele veleiro
que vai a pique
a alma do homem rui
depois que o amor deixou de soprar no oboé
que o anjo pensa tocar
mas quem toca é o amor de um homem
em transe de Fauno
e uma mulher em deleite de Flora
quando atravessa os campos de Afrodite
- penetra o reino de Vênus
empós tais e quais auroras
o homem deixa a pele do Fauno
- troca a pele do Fauno
pela tez do homem morto
pois só se morre
quando o amor morre
sai do sangue
exangue
Agora ele está em paz das pás de terra-sobre
coberto pela espessa treva do silêncio
sob teto ou piso de muitas camadas
- agora o homem morto está em paz com as pás
que movem moinhos de vento
e enterram ou desenterram tesouros arqueológicos
paleontológicos
vazados em geoglifos ou hieróglifos
versados em Champollion
- toda a sabedoria de ler
O homem é um paradoxo
- um paradoxo sorites
tanto o homem carregado na planta com alma
como se fosse a alma flores, folhas e frutos
ou o homem morto
dado às moscas
abandonado à dança dos vermes
pois enquanto homem vivo
o ser humano é procurado desde o faroeste
quer seja vivo ou morto
porquanto começamos a vida de onde não começamos : do nada
e retornamos por onde não podemos retornar : ao nada
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