Quando vejo um velho rio
A rolar de lágrimas
Tiradas ao arroio dos meus olhos
- Sofro da síndrome do coração partido!
com toda sua semiologia
Acessível à leitura clínica do leigo
( o leigo da literatura clínica
É o médico que soluça,
Mas não dá solução de continuidade
Ao soluto no solvente...- sovina!,
Insolvente,
- inadimplente na
economia do mercado xadrez
No jerez preto e branco
Que não vem do gargalo).
Um rio no olho
Um goivo no outro olho
Molho no molho d’água límpida
Que molha a mole do edifício
Com as mágoas das
grandes águas
Batendo nas fráguas
Ou represadas nas manadas
Dos dromedários, camelos e cactos...
Águas não são pragas de peixes
Apenas pescados em banhados.
O riacho seco
Acho seco no olho
Sem umidade de aljôfar
Nos pés descalços
De uma madrugada carmelita descalça
Livre do claustro.
Tudo, tutti-frutti é
um rio
Amarelo, verde, negro,
branco no incolor-inodoro,
Douro, Arribas do Douro,
Douro Azul...
O rio São Francisco
De águas fracas
Está um pobrezinho
Que tiraram do berço ao colo
E não se calou nem parou de soluçar;
Sozinho zimbro pelo caminho
Em iluminara nos cantos
dos poetas lacrimosos
Em elegias doídas, puídas...
São Francisco metido em velho surrão
Mendiga o pão
Vive vergado sob a força contextual
Que o reveste do seu tempo,
Onde está preso,
Sob a pressão da máscara de ferro
Que ali soava fé,
Que pode ser outra
forma de se prantear
Na esteira da “Lacrimosa” de Mozart,
Réquiem de ré
Ou arredado do ré
Maior ou menor,
Mas em rito e ritmo de marcha
Do soldado italiano
Que foi São Francisco
Antes dos cânones...
Em ré para a retaguarda
Ou o retrocesso do retrógrado
Varado pelo atavismo avoengo
Em ungüento de soldado espanhol
Que saltou a elegia do poeta
Pranteando o toureiro Ignácio Sanchez Mejias
Morto às cinco horas da tarde
Com pompa de pomba e arte de marte a mártir
Na elegia do poeta Federico Garcia Lorca
- Ensaios ( “Magnum Opus”) à La Montaigne
Para o seu próprio
canto de cisne:
Este o rito do rio chorão
Suspenso no salgueiro-chorão,
Também salso chorão (“Salyx babylonica”),
Árvore caducifólia...
O ribeirão seco
Seca os olhos
Que fica com o olho no peixe
E outro no gato.
Sobre as águas o dobre do silêncio do céu
Que ouço pesar sobre a ribeira
É refinado no ouvido
Nos ossos que mais não batem
Para se ouvir
O tambor que é o mundo
Em seu burburinho d’água.
Rumorejo por onde rumo
Na secura da saracura
Que sacoleja
Próxima ao fio d’água
Que ainda sussurra
E murmurando vai
Álveo abandonado fora
Pelos caminhos dos pés
Que deitam no delta
Toda a literatura de Anchieta na praia
E a geometria clássica,
Que é outra literatura
Não védica nem
médica,
Mas medida para a ciência caber e abarcar:
Ciência é literatura doutrinária,
Engenharia: literatura sobre materiais.
(- Sou, sei , - sou
toda uma literatura:
Sou o homem e o não sou,
Pois o homem não é o indivíduo,
Mas a sua divisão em Zagreu coletivo:
Decapitado, crucificado, esquartejado:
Dissecado enquanto objeto de ciência empírica).
O ribeiro que deita um rumorejo
Dentro de mim
Acorda um delta
Fora do tempo e espaço,
Na geometria euclidiana,
Por onde passa livre da existência
Num ser puro e feito
Da substância que devolve o nada
que sou eu – um homem e o homem
em corpo e sujeito
real , gramatical, geométrico... :
ser enunciado num postulado
que não contém ser ou existência.
( Existência é tensão:
Ser inação na tensão
que deslinda o conceito de nadidade
na nadificação que soa ação...
mas é apenas concerto para ação, cordas e sopros
de oboísta soprando o soprano
no oboé não egoísta : ensaísta de “Magnum opus”).
O remanso manso,
Ganso concebido para voar
Pela eternidade e pelo infinito,
Que é aquilo que torna eterno e infinito
O ser do homem,
O qual sabe a eterno e infinito
Ou inventou essas concepções
Que invibializa sua morte
Ou a arrasta da definição
Mesmo depois que o universo apagar-se
E ainda antes que surgisse
Servido pelas mãos do criador,
Que também se cria
Ao criar o que é
- o que sou
E sei que sou
Para além e aquém do cosmos
Torcido em galáxias
E goiabas esferóides.
Sou o que compreendo
E até onde compreendo ando,
Pois é aonde vou sem medo de fissuras.
Aonde não me compreendo
O ser me racha em dois
Com o não por expressão da fissura
Que abre o não ser,
Que é o ser bipartido,
O qual não sou,
Nem me compreende,
Tampouco me compreendo
Naquele Zagreu,
Avatar de Dionísio,
Partido em mil tiras pelos Titãs.
Dele restou vivo apenas o coração
Em acordo de acordeon...:
Coração num rio de sangue,
Pulsando, latindo vida latina,
Exuberante e luxuriosa
No corpo jovem do poeta Nono de Panópolis,
Épico na Dionisíaca
E autor da Metábole,
Paráfrase de um
Evangelho
( Evangelho é uma torrente
Cujo delta, nascente e foz
Jorra da alma,
Espirra no e espírito...
Torrente de literatura,
Porquanto a literatura
Ostenta todo o conhecimento humano:
Erudição nada mais é que literatura canônica
E sendo a literatura constituída de signos
Falantes, pensantes e desenhados
Ela elenca símbolos no regime da gramática
Cujos objetos formam e informam a geometria:
Um pensar por figuras
Formadas da cobertura e contenção do espaço com formas
E do vagalhão quântico que já preconizara ou intuíra Euclides.
Como os signos e símbolos não podem com a amplidão da
verdade
A literatura a fraciona e fantasia
Criando objetos separados
num universo uno e indivisível,
inseparável, portanto;
esses objetos que não existem
senão “in abstractum”
inventam a ciência, a religião, a filosofia, a poesia
e toda a doutrina do ser
e do não-ser que se pinta em preto
gato do mago e da feiticeira nada faceira
Em razão de tais dificuldades na heurística
Os médicos, os farmacêuticos e os químicos
E mesmo as Grandes Corporações de mercadores de dores
Desconhecem a maioria incalculável
dos efeitos dos fármacos
na interação com
fisiologia e fora desta interação,
os cientistas pouco mais conhecem da ciência
que sua política científica imbuída
por arengas abstrusas
e o empirismo tenta provar o improvável
no comportamento do objeto da ciência
quando objetos da ciência são inexistências cósmicas,
mas realidades realizadas pela ciência.
O que é hilariante
É que o universo
É apenas um verso do que sou
E não dou conta disso
Graças ao veneno
Que desvia minha mente
Da realidade nua e crua
No leite e na Via Láctea exposta
Em grande rio branco
Que aspira por se unir ao cacau “negro”
- presente dos deuses aos homens impolutos
Marcados por lutos e lutas ).
Um caribu com as patas metidas na tundra molhada
Sou eu , que sou um rio,
Um ser que se lança
noutros seres
E não estabelece qual o sujeito ou objeto,
Pois o ser é o não-ser
Ao mesmo tempo quase
Do que quer a doutrina heraclítica
Que Aristóteles almejou abolir,
Num universo em que não cabe sujeito e objeto,
Mas apenas teias de interação
Que faz pensar essa cisão.
Sujeito e objeto é tão-somente dueto prático
Para facilitar a comunicação,
Mas não realidade no corpo cósmico:
Realização para as linguagens matemáticas e discursivas.
Todavia, não sou o caribu,
Nem tampouco o rio:
A abstração que está na formação do zero e do um,
Que é o ser e
não-ser,
Que não sou dois,
Mas um unido
Por tudo e nada,
Pelo todo e pelo nada,
Somente pode ser individualizado como um,
Uma unidade, que se funda na raiz da não-unidade,
Do zero ou do nada.
Não existe o dois para frente,
Pois são meras miragens de um, da unidade.
O caribu não existe,
Senão como ser de linguagem :
Um nada sem a unidade,
Ou seja, uma abstração,
Algo apenas mental, virtual;
Mas um caribu é uma realidade ,
Uma realização natural da junção do nada com o todo,
O zero com o um,
O ser com o não-ser,
Formando a unidades fundamental á existência,
Ao respiro do ser .
O caribu não passa por lugar algum,
Mas um caribu passa
Em massa na manada com as patas sobre a tundra gelada;
passa em massa
E em manada pela
tundra gelada do Alasca...
E eu sou um caribu
Ao vê-lo passar
a passo de rebanho
Ganho pelos olhos.
Sou o texugo (“Taxidea taxus”),
O cão-guaxinim, cão-mapache,
A andorinha-das-barreiras(“Riparia riparia”),
O milho (“Maize”, “Zea mais”...),
O povo do milho: Maias...
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